segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

WOLFGANG HOFFMAN HARNISCH - O VIAJANTE

Wolfgang Hoffman Harnisch, nasce na cidade de Frankfurt, Alemanha, em 13 de maio de 1893. Trabalha, em solo europeu, como jornalista e dramaturgo, e viaja com destino ao Rio Grande do Sul em 1939, com o objetivo de pesquisar o ambiente cultural, assim como com a finalidade de escrever a biografia de Getúlio Vargas.
Como viajante, está sujeito a perigos e encantos, entra em contato com o homem e sua natureza, descobre novas culturas, que o chocam ou não. De qualquer forma, instiga a produção de conhecimentos, seja por relatos, seja por imagens, registram e traduzem a visão do viajante acerca daquilo que lhe é mostrado.
Parte do Rio de Janeiro a caminho do Rio Grande do Sul com a intenção de escrever um pequeno relato de suas aventuras pelo estado. Faz este trajeto pelo mar, desembarcando em Torres, e pode-se notar seu entusiasmo através de suas palavras:

“‘Toujsur le sable et la mer’ - sempre areia e mar. Realmente não se poderia entrar no RS por pórtico mais lindo do que esse. Formado por singulares colunas, Torres. Passamos na praia, entre o tumulto dos banhistas, entre sol e areia. Chegam pelo avião da Varig, de auto e de ônibus... O contingente principal é representado por  porto alegrenses. Ouve-se também falar castelhano, italiano, alemão, e a multidão apresenta um ambiente internacional.”

Nota-se, também, em sua fala, certa melancolia, nostalgia ou talvez até mesmo romantismo, ao descrever a gente que aqui encontra:

“Cavaleiro com chapéu de abas largas, um amplo poncho e lenço ao pescoço, botas de cano alto e grandes esporas, o relho na destra, a pistola na guaiaca, assim atravessava a colônia, por caminhos solitários que ele conhecia palmo por palmo. Ao longo dos rios, serra acima, vencendo os planaltos, descendo pelos campos da fronteira.”

Segue seu discurso descrevendo os pampas, suas estradas, o movimento do gado e a vida agitada dos que lá vivem. Também pontua a questão das diferentes etnias que formaram o povo gaúcho e que mesmo com estas influências não deixa de se caracterizar “por um tom tipicamente brasileiro”, com aspectos que “chegam a oferecer a feição de um Brasil passado, muito distante, muito velho”.
Ao delinear o perfil do gaúcho, estabelece uma analogia ao centauro, quando afirma:

 “O Pingo, cavalo, é uma parte do seu eu, forma com ele uma unidade. Sem o pingo, o gaúcho seria só a metade de um todo admirável. Corporifica o mito do centauro. (...) E como esses homens formam, com seus animais, uma unidade indivisível, assim também se relacionam com a paisagem. Não podem ser imaginados fora do ambiente em que vivem.”

Segue afirmando que antes dos meninos aprenderem a caminhar, já andam a cavalo, e na idade em que deveriam frequentar escolas, aprendem a manejar o laço.
Fala, também, das virtudes cavalheirescas dos gaúchos, comum a todos, independente da classe social a qual pertençam. Conta, que nos pampas, a propriedade é considerada algo sagrado, sendo a palavra ladrão o mais grave dos insultos, seguido de covarde. Comenta que o gaúcho é um homem silencioso, que cumpre com suas tarefas sem retrucar, e quando algo lhe incomoda, pede sua conta e vai-se embora.
Descreve:
“Nunca esquecerei os movimentos desses homens. Nem podem ser os movimentos de atores, no palco, representando uma paca épica, mas, note bem, exímios atores. Que sabem tirar partido dos meneios, articulações e da afirmação de força de seus movimentos. Nunca esquecerei como me compreenderam, e apesar de todas as dificuldades linguísticas, com que rapidez e segurança, deduziram de minhas feições o que eu desejava. E como traduziram meus pensamentos nas palavras de seu vocabulário gaúcho. (...) Também o gaúcho come seu pão cotidiano regado pelo suor de seu rosto. Já passaram os tempos do romantismo bélico e revolucionário. Começou a terceira fase, a fase do trabalho. O churrasco pode ser considerado como prato diário e é o clássico alimento das festas campestres do Rio Grande do Sul. Recorre-se a ele até para assinalar a passagem de um acontecimento importante. Certa vez, tomei parte num churrasco.”

Em sua viagem ao Rio Grande do Sul, visita a região das missões, e narra-a com grande admiração. Percebe-se seu deslumbramento diante das reduções de São Miguel no trecho que segue:

“Uns passos mais e, diante dos meus olhos encantados, deslumbrados, aparece uma vista maravilhosa, sobre a colina, erguem-se as ruínas da catedral. Um castelo rosado, construído de pedra de cantaria vermelha, reverberando os raios rubros do sol da tardinha. Por uns instantes estou como extasiado. Daí vou subindo, lentamente, a ladeira, passando junto aos restos de muros, últimos testemunhos das quadras de casas, que outrora aqui estiveram localizadas. A fachada da catedral me fascina, prende pela sua imponente abundância de contornos arquitetônicos de toda a espécie. É preciso tempo para a gente orientar-se por entre a infinidade de colunas e pilastras, bases e capitéis, espirais e ornamentos variados.”

Expõe que e lá que existiram as melhores plantações e criações de gado, local onde foram celebradas as primeiras grandes festas, regadas à dança, música e jogos. E completa afirmando que sem as missões os índios das Américas teriam sido totalmente exterminados. Busca outra redução, a de São João Batista, com ajuda de mapas e indicações, entretanto, os únicos vestígios que encontra são poucos metros da fundação de uma parede, assim como algumas pedras talhadas, cobertas por raízes de árvores e um cemitério.
Na fase final de sua viagem pelo estado, ele chega, novamente, a Porto Alegre, por volta de 1942 e tece comentários acerca do desenvolvimento da cidade:

“Nos dois anos que medeiam entre a minha chegada e partida, modificou-se profundamente o aspecto de Porto Alegre. O quarteirão de arranha-céus, que se esgueiram ao longo da Avenida Borges de Medeiros, deu ao centro da cidade uma nota nova e peculiar. E alteraram, também, a silhueta de todo o aspecto urbano. (ano da grande enchente)”

Harnisch, em seu relatos, apresenta uma característica diferente dos outros viajantes, registra, em fotografias, cenas do cotidiano rio-grandense. Preocupa-se em documentar os tipos humanos, assim como as paisagens. Busca no homem suas virtudes. Enaltece, elogia, mostra com altivez os trabalhadores dos locais que conhece e, também, os ambientes em que vivem.
Esta não foi sua única experiência no Rio Grande do Sul. Estivera no estado em outras ocasiões, quando em viagens para a Argentina, Chile e Peru e suas primeiras impressões, ainda que fugazes, o fizeram retornar e comprovar essas idealizações acerca do homem gaúcho. Ainda afirma que “o Brasil e o Rio Grande do Sul não se devem considerar como um todo e uma parte do mesmo”.
Sua intenção de escrever os relatos de sua viagem foi cumprida com o livro O Rio Grande do Sul – A terra e o Homem, com todas as narrativas acerca de sua viagem, que durou dois anos, pelo estado.  Dentre as cidades que percorreu pode-se citar: Pelotas, Bagé, São Gabriel, Santa Maria, Alegrete, Santana do Livramento, Uruguaiana, São Borja, São Luiz Gonzaga, São Miguel, Santo Ângelo, São João Batista, Cruz Alta, Tupanciretã, Irai, Viamão, Triunfo, Taquari, Estrela, Lajeado, Venâncio Aires, Santa Cruz, São Leopoldo, Novo Hamburgo e Porto Alegre. Ao final do vídeo ele se questiona: “quando entrei em contato com o rio grande do sul, não mais pude desvencilhar-me. Porque é isto assim? Como é que isto se deu? Como esta terra se desenvolverá?”

HARNISCH, Wolfgang Hoffmann. RELATO DO VIAJANTE
RBS TV. SÉRIE OS VIAJANTES - WOLFGANG HOFFMAN HARNISCH.

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