quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Ainda sobre fotografia...



A construção da nossa capacidade de olhar está diretamente relacionada com a simbolização acerca da criação e leitura de imagens. O olhar é aprendido, educado de forma articulada com outros olhares, ele não é individual, e sim, determinado socialmente, por um conjunto. E é em função destes diferentes tipos de olhar que são determinados os tipos de imagens e de que formas as pessoas se relacionam com elas.
Desde sua origem, a fotografia desenvolve-se como importante meio de representação, possibilitando a construção e transmissão de imagens. Seu aspecto mais importante é definir identidades de coisas e pessoas.
A fotografia, segundo alguns textos, não tem a subjetividade da pintura, que não se identifica completamente com o real, e sim, cria imagens, interpreta o olhar, enquanto a fotografia passa a ser o real. Vemos a pintura passível de interpretações e a fotografia como técnica dura, de perspectivas definidas pela câmera. Artistas de vanguarda, no século XX viram na câmera a materialização de uma ideologia.
Afinal, fotografia pode ou não ser definida como uma manifestação artística? Discussões em torno deste assunto foram geradas pelo fato da fotografia ter características documentais e também artísticas, sendo também, considerada por alguns, uma forma de narrativa poética. Segundo as palavras de Walter Benjamin:

“Gastaram-se vãs sutilezas a fim de se decidir se a fotografia era ou não arte, porém não se indagou antes se essa própria invenção não transformaria o caráter geral da arte (BENJAMIN, Walter. In OLIVEIRA, Rogério L. S. e FARIAS, Edson S.).”

Mead e Bateson também deixam a ideia de que materiais visuais, fotografias, por exemplo, antes de serem reproduções da realidade, são “textos”, declarações e interpretações sobre o real. A fotografia, portanto, pode ser entendida como imagem-poesia do cotidiano, descrevendo acontecimentos da rotina, assim como uma crônica. Uma narrativa apegada aos detalhes captados pelo olhar apurado do fotógrafo-poeta, uma escrita de cujas palavras são feitas de luz. Nas palavras de Susan Sontag:

“A própria realidade passou a ser entendida como um tipo de escrita, que tem de ser decodificada – enquanto as próprias imagens fotográficas foram, a princípio, comparadas à escrita (SONTAG, Susan).”

Fotografar sempre implicou na decisão de um determinado recorte da realidade presente. Com a digitalização das imagens, pode-se inscrever a fotografia, finalmente, como arte ou como uma forma especial de discurso, produção do visível, discurso visual, texto.
Segundo Sontag, fotografar é apropriar-se do objeto fotografado; é brincar com a escala de mundo, que pode ser reduzida, ampliada, recortada, consertada, distorcida; é envelhecer, como tudo o que é feito de papel, e desaparecer; é valorizar, ser comprada, vendida e reproduzida.
Se antigamente a preocupação em relação à fotografia era provar o real, hoje percebemos que nossos olhares são distintos e a suposição que se fazia de uma imagem impessoal e objetiva dá lugar a ideias que vão além do registro, isto é, pessoal e subjetiva. A fotografia hibridiza novas formas e cria outras representações e movimentos artísticos e culturais.
A cultura se modifica de acordo com as necessidades dos homens nela inseridos, tem a função de ordenar as informações de uma sociedade, criando ritmos próprios, ou seja, selecionamos o que nos interessa e descartamos o restante, num eterno processo de reordenação, onde informações são reelaboradas e recriadas.
Vivemos um período de desconstrução da linguagem fotográfica e da redefinição de seu papel na sociedade. Momento que visa à articulação dos discursos fotográficos e antropológicos, uma vez que o homem e suas formas de organização e simbolização sempre estiveram no foco do fazer fotográfico e antropológico. A fotografia, isenta de seu ideal de representar a realidade, pode desempenhar com maestria a função de imprimir representações de vínculos sociais e simbólicos.


(trecho de leitura de imagens feita no ano de 2010.)

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